Não chore sobre minha cova, pois que está vazia
Não estou ali, imóvel, em sono perpétuo em madeira e aço.
Vivo em cada ato do que fazia
Existo em todo detalhe daquilo que faço.
.
Sou vento e chuva a dançar pela estrada
Em cada brisa e gota me movo sem cansaço
Não se quede triste e desolada
Porque na morte vivo, entre paradoxos me desfaço.
.
Sou caos e revolta, paz e mansidão
Aceitação e resiliência, inconformidade e indignação.
Em mim, contrastes se entrelaçam, sem tempo ou espaço
Habito dentro de ti e em cada um de teus passos
.
Quem ousará me decifrar, decodificar meu ser?
Sou enigma, um mistério a pairar
Em cada verso e cada olhar, suspense a renascer
.
Não lamente minha partida, porque ir também me agrada
Hei de sondar além, uma aurora e alvorada.
Sou a essência que aflora e ainda que enfada
De um pouco sou um tudo, de um tudo feito em nada
.
Em cada esquina e seu suspiro, lá estarei eu
Não em fria sepultura, mas na eternidade do ar.
Minhas palavras e sorrisos, abraçad’os olhos teus
Ecoando som sem túmulo, no horizonte a anunciar.
.
Sou brilho pálido na praia
Apontando porto além
Sou o verso da aia
Que canta ao vai e vem
.
Sou perigo de naufrágio
Areia rasa enganosa
A perda no sufrágio
A vitória da rosa
.
Sou o tanque na rua
O fuzil ardente em mão
Sou o brilho da lua
Sou povo e solidão
.
Sou dor e sou vontade
Rasgo peito e coração
Sou desejo na cidade
Sexo e corrupção
Sou a mostra da verdade
Esconderijo da razão
Grita garganta liberdade
Sou a inocência largada ao chão
.
Sou palavras e sonhos, tecido com furos
Saudades do passado, nostalgia de futuro
Ironia ingênua, sou medo do escuro
Ainda assim “eu sou”, sem promessa e seguro.
.
Não chore sobre a cova, pois que mente seu anúncio
A lápide que me aponta, não me encontra em seu prenúncio
Vazio está o chão, pois poeta é imortal
Quem cria a criação, já venceu o bem e o mal!
Deixe um comentário