Renan De Simone

Especial “Negociação”, 2ª PARTE: Em vez de confronto, cooperação (novembro/2009)

“Transformar o confronto em cooperação é a chave para o sucesso de uma negociação”, afirma o especialista William Ury, um dos mais celebrados nomes em técnicas de negociação, cofundador e diretor do Programa de Negociação da Universidade de Harvard.

Em passagem pelo Brasil, como palestrante do Fórum Mundial de Negociação da HSM Management, o antropólogo, com Ph.D. pela Harvard, apresentou a empreendedores e executivos algumas estratégias e relatou experiências que mostram como devem se posicionar os profissionais para que obtenham melhores resultados dos processos de negociação.

Para ele, que reúne 30 anos de experiência em estudos sobre o tema, todos nós negociamos, desde o momento em que levantamos, pela manhã, até a hora em que vamos dormir. “O exercício da negociação começa em casa, com o marido, a esposa, os filhos. Esse grupo é, talvez, um dos mais difíceis de se administrar, dada a complexidade das relações. Mas, mesmo quando chegamos ao escritório, somos levados à intensa negociação com nossos pares, colaboradores e líderes (mesmo que tenhamos os mesmos objetivos) antes mesmo de partir para uma negociação externa”, explica Ury, reforçando que a maior vantagem competitiva que um negociador pode possuir é a capacidade de se mostrar disposto para cooperar.

Obstáculos

Entre os obstáculos para o entendimento dos interlocutores está a inabilidade em buscar saber o que, de fato, é relevante para a outra parte em uma negociação, descreve o especialista. Segundo ele, quem entra numa negociação precisa ter uma “curiosidade fundamental” para identificar o que é a essência do rol de argumentações apresentadas pelo outro lado.

“É preciso entender o porquê! Conhecer as reais razões e interesses da parte com que estamos negociando. Todos estão dispostos a fazer algumas concessões durante uma negociação, mas, para isso, deve haver o entendimento e conhecimento dos aspectos essenciais e que são defendidos por cada um dos lados”, define Ury.

Uma das explicações para que essa “curiosidade” deixe de ser explicitada durante uma conversa de negociação é o nervosismo e apreensão dos negociadores. “Todo líder de uma negociação está sob pressão dos interesses do grupo que representa, por isso pode deixar de explorar as possibilidades de diálogo por medo de decepcionar, e não atender às expectativas de seus representados”.

Sob a pressão de tais dificuldades, surge, assim, o segundo fator que mais prejudica o andamento de uma negociação: a atitude reativa que, além de não contribuir, pode pôr a perder o entendimento. “Pergunte-se: quem são as partes; quais são os interesses em jogo; o que você quer; e o que a outra parte quer?”, aconselha o professor.

“Ouça o outro (para compreender, e não refutar) e, se a apresentação for agressiva, dê um passo para trás, se necessário, e foque o ‘prêmio’ da negociação, ou seja, o acordo. Não hesite em dialogar sobre o que o seu interlocutor disse a você; use o pretexto de que quer ter certeza de que compreendeu corretamente o que ele apresentou”, pontua Ury.

Regras

Dentro deste contexto, o especialista orienta que o foco exclusivamente voltado ao resultado material de uma negociação pode interferir negativamente no processo. O mais importante é chegar a um entendimento que traga benefícios para as duas partes, portanto, esse deve ser o alvo. E, explica ainda, que o caminhar das conversas sempre será influenciado pelo estabelecimento de regras que ditarão o ritmo da negociação.

Para mostrar como é importante a existência de regras que devem ser obedecidas pelos participantes de uma negociação, Ury cita um exemplo vivenciado por ele e que ilustra de forma clara a situação. “Em uma oportunidade, um dos negociadores, um policial, entrou na sala de reunião com a arma na cintura. A situação causou mal estar e levou a uma interrupção das conversas – que iam bem. Estava ali, presente, um símbolo da indisposição em negociar. Afinal, quem discordaria de um homem armado?”.

Ury disse que, na ocasião, era mediador das negociações e teve a oportunidade de comentar que a presença de alguém armado não era recomendada. “O policial pediu desculpas e disse que não fez com más intenções. Ele estava atrasado para o encontro e por isso não teve tempo de retirar a farda e seu equipamento. De qualquer forma, removeu a arma da cintura e a tirou do local em que ocorriam as negociações, o que possibilitou a retomada dos diálogos”.

Técnicas para uma boa negociação

No que tange às técnicas para alcançar o sucesso de uma negociação, William Ury aponta que a busca por um distanciamento da situação ajuda a obter uma visão mais clara dos reais interesses a serem atingidos. “Quando os ânimos estão exaltados, deve-se ir ao ‘balcão’ (local em que é possível se afastar física e psicologicamente do cenário de debates), vislumbrando uma compreensão mais clara, como se, por um momento, não estivesse mais no papel de parte envolvida na negociação”.

De acordo com ele, o negociador deve aproximar e também afastar “a lente de observação” para que consiga analisar o cenário de disputas com mais clareza.

Essa habilidade é resultado do preparo do negociador, possível por meio do estudo dos assuntos que farão parte da negociação: a preparação para o ingresso em uma mesa de negociações, uma postura que vislumbre ganhos para ambas as partes, o planejamento de ações para administrar situações difíceis, e a disposição para refletir após cada negociação, visando o aprendizado com as situações vividas. “São medidas que possibilitam a formação de especialistas nesta área”, defende.

Se, ainda assim, não for possível chegar a um entendimento, Ury afirma que o negociador deve se colocar na posição da parte com a qual está dialogando e tentar oferecer alternativas à impossibilidade de se estabelecer um acordo, sempre respeitando seus interlocutores. “Não rejeite, mas redirecione as discussões. Diga ‘não’ quando necessário, mas ofereça alternativas que busquem evitar o encerramento das negociações, tornando um acordo atrativo para a parte com a qual se negocia”.

Negociadores devem buscar compreender os interesses subliminares das partes com as quais estão dialogando para que seja possível estruturar um acordo cooperativo. “Assim, faça do ‘não’ apenas o recheio da oferta. Esta palavra deve proteger o essencial de suas posições, mas sem encerrar outras possibilidades de entendimento”, defende o especialista em negociação.

Por fim, Ury afirma que em uma negociação comercial, o profissional deve estar consciente e bem informado sobre quais critérios objetivos formam seu preço e quais deles é possível administrar (interferir) para garantir a conquista de um negócio. “Trabalhe o seu potencial para chegar ao ‘sim’ e possibilitar o ganho mútuo”, conclui.

Conteúdo produzido por Moraes Mahlmeister Comunicação. Texto de Renan De Simone; edição e revisão de Juliana de Moraes. Publicado pelo site do Sincodiv-SP Online.