Renan De Simone

Valor alinhado à atitude é fórmula para Saúde e Qualidade de Vida no Trabalho (novembro/2015)

“O que você faz hoje está alinhado com os seus valores de vida?”. De acordo com Carlos Dias, gerente médico da Johnson & Johnson, especialista em Medicina do Trabalho pela ANAMT (Associação Nacional de Medicina do Trabalho), esta é a pergunta base sobre a saúde e qualidade de vida no mundo profissional.

Ele e outros especialistas e autoridades estiveram no XV Congresso Brasileiro de Qualidade de Vida, que aconteceu de 26 a 28 de outubro, na capital de São Paulo, reunindo agentes de diversos setores da economia, incluindo executivos do segmento de energia que compõem os grupos de trabalho da ABQV (Associação Brasileira de Qualidade de Vida), entidade organizadora do evento.

Dedicação de energia

Dias explica que existe uma quantidade limitada de energia que as pessoas conseguem aplicar em seu dia a diferentes atividades. “A diferença entre vida com qualidade e saúde ou doença é o gerenciamento adequado dessa energia de acordo com nossos valores”.

O executivo apresentou o projeto E4PI (Energia para Desempenho na Vida, na sigla em inglês), aplicado na Johnson & Johnson, segundo o qual a gestão do tempo e da energia corretos contribui para profissionais mais felizes e saudáveis.

Alinhamento com valores

Ele explica que a maior parte das pessoas, quando classifica aspectos da vida – do mais importante para o menos relevante – elenca os seguintes itens: saúde, família, amigos, trabalho/dinheiro e comunidade. “Entretanto, quando pedimos para que elenquem os mesmos itens na ordem em que são priorizados por dedicação de tempo, o resultado é: trabalho/dinheiro, amigos, família, saúde e comunidade”.

Segundo ele, a disparidade entre os valores e a atitude é o principal fator de adoecimento físico e mental das pessoas e, consequentemente, o péssimo rendimento profissional a que muitos acabam submetidos pelas escolhas inadequadas que conduzem.

Decisões

Para Eduardo Bahia – médico especializado em Cardiologia e Medicina do Trabalho que atua como consultor de organizações em Qualidade em Saúde e Acreditação Hospitalar –, também palestrante do evento, a Saúde no Trabalho é determinada pelas decisões.

Bahia afirma que, atualmente, já temos o conhecimento científico e programas para lidar com os riscos ocupacionais tradicionais nas organizações. “As escolhas em se lidar ou não com eles da maneira adequada são das empresas. A grande questão é como implantar e como pensar os riscos (novos) relacionados a novas jornadas, assédio, problemas psicossociais, etc.”, diz.

Ele é crítico ao afirmar que não há sentido em falar de programas de tratamento e de saúde no trabalho no médio e longo prazos (como o PAE – Programa de Assistência ao Empregado) se a empresa tem um turnover de três ou quatro meses. “É necessário ser honesto e se adequar à sua realidade. O programa não é e não deve ser superficial e aparente”. Uma vez implementado, deve ser tido como parte estratégica para a empresa em alcançar sua missão, segundo o especialista.

Em relação à honestidade e transparência de atitude, Bahia também é duro com os colegas de profissão, dizendo que os médicos têm sido negligentes em sua grande maioria.

“Os exames médicos de admissão, por exemplo, devem ser executados de maneira completa e com profundidade, conhecendo-se o histórico do profissional e examinando-o de cima a baixo. A forma atual é antiética de tão rápida e superficial como ocorre”, pontua, colocando que isso afeta a produtividade da empresa e a eficiência dos programas de qualidade de vida dentro das organizações, pois terão de lidar com questões não identificadas previamente.

Transparência e diálogo nas empresas

Para os profissionais dentro dos programas de saúde e qualidade de vida que são identificados com problemas mentais e emocionais, é preciso haver cuidado no trato e também quebrar muitas barreiras sobre a abordagem de tais questões dentro da empresa para não se rotular o empregado, segundo João Lins, sócio da PwC (PricewaterhouseCoopers) e líder da consultoria de People & Organization no Brasil.

Ele enfatiza que é possível e necessário lidar com tais aspectos nas organizações, mas que as intervenções devem ser realizadas por pessoas preparadas. “A empresa também pode pensar em parcerias com universidades para atuar de forma mais positiva nesse aspecto”.

Para quebrar estigmas e preconceitos em relação a profissionais que sofrem de problemas mentais e emocionais, Lins diz ser necessário preparar melhor as lideranças também. “Devemos investir na sensibilização dos líderes, pois são eles que podem criar espaços para discussão e alimentar uma cultura sem preconceito”.

Todos são responsáveis

O especialista em Cardiologia e Medicina do Trabalho defende que, em contrapartida, não se pode relegar aos líderes toda a responsabilidade pelos trabalhadores das empresas.

“É verdade que eles são responsáveis por criar um ambiente favorável e de cultura positiva, mas temos de parar de culpar apenas as lideranças a respeito das práticas de saúde e qualidade de vida no trabalho. Os profissionais devem participar das decisões de seu tratamento e cuidados também”, sinaliza Bahia.

O médico lembra que devemos ser cuidadosos ao exagerar em benefícios e políticas paternalistas dentro e fora das empresas, afinal, as pessoas devem ser vistas como capazes de tomar suas próprias decisões. Além disso, ressalta que existem, sim, problemas nos pacotes de benefícios e programas de qualidade de vida oferecidos pelas empresas, mas que são tentativas reais de se melhorar a vida dos empregados.

“Não se pode pensar apenas no lado ruim. O trabalhador que recebe benefícios, ainda que estes apresentem problemas, ainda está numa situação muito melhor do que aquele sem trabalho nem benefícios. Temos de corrigir e não condenar”, completa Bahia.

Reflexões

Bahia oferece ainda alguns pontos para se refletir, ressaltando que os profissionais de saúde e qualidade de vida e o setor público preocupados com esse aspecto devem olhar para as pequenas empresas, pois essas organizações não têm recursos para grandes programas de saúde no trabalho, “mas é justamente nelas que está localizada a maior parte da força de trabalho brasileira”.

Ele também destaca que prevenção é sempre preferível em relação à remediação, mas que nem sempre acontece, pois exige maior esforço. “A grande questão que se apresenta a nós, ultimamente, é a de que é mais fácil se tratar da doença do que da saúde. Ou seja, é mais simples tomar medidas e remédios depois de desencadeada a doença do que cuidar da saúde dia a dia, sendo preventivo, consciente e fazendo escolhas saudáveis”.

“Devemos ter um código de ética e conduta unificado para ser respeitado por todos os profissionais preocupados e que atuam na área de Saúde e Qualidade de Vida no Trabalho”, completa ele, sinalizando que é necessário haver um entendimento entre psicólogos, psiquiatras, médicos, enfermeiros, assistentes sociais, pessoal de RH e quaisquer outros profissionais preocupados com o bem dos empregados e, necessariamente, das empresas que resultam da dedicação dessas pessoas.

“Entendo que esse o caminho da melhora de desempenho, saúde e produtividade”, finaliza.

Conteúdo produzido por Moraes Mahlmeister Comunicação. Texto de Renan De Simone; edição e revisão de Juliana de Moraes. Publicado pelo site do SindiEnergia Comunica.

Para acessar a publicação original, clique aqui: http://www.sindienergia.org.br/noticia.asp?cod_not=2928