Renan De Simone

Bate-papo com Marie-Josette Brauer, psicóloga especialista em coaching (outubro/2011)

Psicóloga, hipnoterapeuta ericksoniana, especialista em PNL (Programação Neurolinguística) e coach, Marie-Josette Brauer é uma figura curiosa no cenário corporativo. Francesa radicada no Brasil, Marie atuou na área clínica durante anos antes de se especializar, nos Estados Unidos, com os papas da PNL – John Grinder e Richard Bandler –, e voltar ao Brasil atuando no mundo empresarial. De acordo com ela, desenvolver pessoas passou a ser prioridade, em vez de cuidar de patologias.

De fala rápida, jeito expressivo, e bem-humorada, Marie é defensora do conceito de Personal Branding em oposição ao conhecido Marketing Pessoal. Segundo ela, encontrar o dom único de cada um, desenvolver habilidades específicas e trazer a tona o modo mais verdadeiro de ser da pessoa é justamente o desenvolvimento dessa “marca pessoal” – e um processo alcançado pelo trabalho de coaching.

Nesse Bate-papo, Marie conta um pouco de sua experiência e fala das crises nas empresas familiares, da solidão dos altos executivos, das crenças e decisões limitantes, das ferramentas de seu trabalho, e dá dicas de como o líder pode identificar falhas em sua conduta e buscar soluções no dia a dia.

Sincodiv-SP Online: Logo após sua formação em psicologia que linha terapêutica seguiu? O que a fez expandir o horizonte e acrescentar outros modelos fora da área clínica?

Marie-Josette: Sou psicóloga e filósofa por formação. Comecei na área clínica atuando em psicanálise Kleiniana. Naquela época, na década de 60, não existiam muitas opções. Como de costume, o trabalho era voltado especificamente para casos de patologia. Você atuava na tentativa de recuperação. Sempre achei que as ferramentas disponíveis poderiam ser melhores utilizadas em outras circunstâncias e comecei um curso empresarial na FGV (Fundação Getúlio Vargas), o que me abriu os horizontes.

Na década de 80, entrei em contato com aquela que viria a ser uma das minhas melhores ferramentas de trabalho, a PNL (Programação Neurolinguística) e outras técnicas chamadas de “terapias energéticas”,  como por exemplo a EFT (Técnicas de Libertação Emocional, na sigla em inglês). A partir daí, meu foco passou a ser inspirar pessoas comuns que queiram se tornar mais capazes. Meu trabalho passou a ser o de desenvolver pessoas.

Sincodiv-SP Online: O que é a PNL?

Marie-Josette: A PNL é um modelo de funcionamento cerebral que foi desenvolvido por John Grinder e Richard Bandler, e se baseia no conceito de que a mente, o corpo e a linguagem devem ser levados em conta quando da percepção de mundo do indivíduo.

A ideia básica desse modelo é que existe a ferramenta adequada para se resolver cada situação, ou seja, encontrar a chave certa para a fechadura. Se você utiliza uma técnica que não serve para aquela situação, a coisa não dará certo.

Essa prática leva em conta que cada pessoa tem uma “linguagem” predominante. Existem pessoas que entendem melhor a linguagem visual, outras a auditiva, outras são mais sinestésicas, etc. Cada indivíduo tem seu canal prioritário de absorção e de emissão para se relacionar com o mundo. Curioso é notar que o input e output nem sempre são iguais. Eu posso ser uma pessoa que compreende as coisas melhor visualmente, mas que transmite melhor verbalmente, por exemplo.

Com tais conceitos em sua base, a PNL traz ferramentas e procedimentos adequados a cada necessidade para desenvolver indivíduos. É um método de aprendizagem e evolução que me ajuda a despertar a Personal Branding das pessoas.

Sincodiv-SP Online: Qual é o conceito de Personal Branding?

Marie-Josette: Quando passei a desenvolver pessoas por meio de um trabalho de coaching, percebi que ninguém era igual, cada um tinha seu “quê” especial, sua particularidade. À época, era muito comum se ouvir falar de Marketing Pessoal e de uma série de “roteiros”, por assim dizer, de como se portar, falar e fazer as coisas, mas vi que aquilo não funcionava.

Padronizar não é garantia de resultado. Como costumo brincar, a roupa é emprestada. Aquilo não é seu e, passada uma entrevista de emprego, por exemplo, você volta a ser quem é e a “máscara” criada cai.

Depois de estudos nos Estados Unidos, voltei com essa nova forma de pensar, o desenvolvimento da Personal Branding, que é sua marca pessoal, você é a marca! O conceito é simples e consiste em ser verdadeiro e buscar aquilo que há em você de mais peculiar e único, seu dom, aquilo que você sabe fazer de melhor, e desenvolver.

O conceito é simples, mas alcançar esse estágio nem sempre, por isso é necessário que alguém o ajude a encontrar a maneira certa de desenvolver as competências. Isso é feito por meio de um trabalho de coaching.

Sincodiv-SP Online: Quais os benefícios deste trabalho num mundo onde as pessoas parecem viver de aparências?

Marie-Josette: Conseguimos extrair o que há de melhor nas pessoas e o sucesso acontece naturalmente. Quando você trabalha com algo que não é o seu dom, ou que é incompatível com ele, você oferece travas.

O interessante é notar as pequenas diferenças entre a atuação de pessoas que não estão na área que deveriam e aquelas que apenas precisam de coragem ou iniciativa para se desenvolver no que já são boas. Cada um tem seu dom, mas se ele não for trabalhado, pode perder validade. É uma questão de esforço, persistência, trabalho, aperfeiçoamento (por cursos, especializações), técnicas, mas, antes de tudo, é preciso saber o seu talento.

Só o dom não basta, assim como só esforço e persistência também não. De um lado você não se desenvolve como poderia naquilo em que é bom, de outro, pode ficar insistindo em algo que não deveria. É preciso unir as duas coisas.

Sincodiv-SP Online: Qual é a maior dificuldade que as pessoas costumam trazer para solucionar no trabalho de coaching?

Marie-Josette: Estarem perdidas, não saber que rumo tomar. Essas são questões que aparecem independentemente da classe social, nível cultural e etc. Essas dúvidas e incertezas profissionais ocorrem bastante com sucessores de empresas familiares.

Sincodiv-SP Online: Por que essa incerteza é recorrente nas pessoas dentro do modelo de negócio familiar?

Marie-Josette: Pela mistura de dois universos distintos. A maioria das pessoas se acostuma a trabalhar o profissional em separado do pessoal, o que não é correto, afinal, somos uma única pessoa. Entretanto, brigar no trabalho ou em casa corresponde a uma situação. Agora, imagine brigar no trabalho e ter de encontrar a mesma pessoa numa festa de família ou quando se chega em casa para descansar.

Outro ponto problemático é o fato de as pessoas se apegarem muito ao passado. Uma pequena intriga de irmãos quando pequenos pode se refletir anos depois na atuação da empresa, por exemplo!

Sincodiv-SP Online: Principalmente os líderes, queixam-se por não terem a quem confiar seus conflitos. Existe alguma técnica para que cada um consiga exercitar um trabalho de coaching em si mesmo?

Marie-Josette: A liderança é uma posição muito solitária, justamente por não poder compartilhar tais temores. Por essas e outras que o trabalho de coaching é necessário. Para aqueles que querem identificar possibilidades de melhoria, podem buscar:

  • Prestar atenção ao ambiente e escutar as pessoas;
  • Perguntar-se constantemente o que não te agrada e o que poderia modificar;
  • Evitar a negação. Todas as pessoas recebem etiquetas e rótulos. Pare de negar os seus e jogar a culpa nos outros. Busque saber o que te levou àquela posição e, se a “etiqueta” não te agradar, pense em como mudar;
  • Conscientize-se de suas fraquezas e de suas habilidades. É mais fácil trabalhar com pessoas que admitem os pontos em que precisam de ajuda e que conhecem aqueles em que são bons;
  • Não se coloque como vítima. Essa posição indica um ser passivo, sem força de atuação;
  • Seja o ator protagonista da sua vida;
  • Pense em como lapidar suas qualidades para melhorá-las.

Sincodiv-SP Online: As lideranças se tornam referências de coach para suas equipes. Como eles devem atuar para favorecer o desenvolvimento de pessoas?

Marie-Josette: Para poder ter uma equipe de qualidade e desenvolver pessoas no campo profissional, o líder precisa, antes de tudo, saber montar o time. Para isso, a melhor pergunta a se fazer é: qual é o objetivo que essa equipe deverá cumprir? A partir daí você busca os perfis necessários e que se complementem. O líder precisa de carta branca para tocar seu time, remodelá-lo quando necessário, etc.

A parte mais difícil é achar pessoas que queiram apoiar o líder para um trabalho bem feito. O maior problema é que as pessoas da equipe parecem sempre estar lutando para tomar o lugar do líder ao invés de atuar ao lado dele. Isso dificulta a relação.

Se tiver o objetivo bem definido, a equipe bem montada e o próprio líder buscar coach para orientá-lo, o sucesso é certo.

Sincodiv-SP Online: Como você acredita que os RHs das empresas podem atuar para ajudar o profissional a encontrar seu espaço e dar o melhor de si?

Marie-Josette: Acho que a grande falha dos RHs das empresas é achar que as ferramentas e medições são fins em si mesmos. Treinamentos, avaliação 360 graus, pesquisas de clima, todos estes meios são válidos e úteis para ajudar a desenvolver pessoas, mas a grande questão é que as pessoas não sabem o que fazer com os resultados. Entender o que está acontecendo com cada indivíduo funciona melhor, sempre visando, claro, os lucros para a organização.

Descartar pessoas é fácil, o problema, porém, é ter a pessoa certa na posição errada, isso acontece muito. Despedir não deveria ser a primeira opção.

Sincodiv-SP Online: Existe algum fator que possa prejudicar o trabalho de coaching?

Marie-Josette: Se a pessoa procura esse trabalho, significa que alguma coisa a incomoda, seja algo que a está prejudicando ou a vontade de crescer profissionalmente. Meu trabalho consiste em desenvolver as pessoas e, para isso, no início, estabelecemos, juntos, metas a serem atingidas. O maravilhoso da profissão é não só atingir os objetivos estabelecidos, como também quebrá-los.

O coaching fica prejudicado quando é imposto. Muitas empresas institucionalizam a prática e isso nem sempre funciona, especialmente quando o coach está dentro da empresa e, normalmente, consiste num profissional hierarquicamente superior ao funcionário “atendido”. A pessoa que está sendo orientada perde liberdade, não é sincera e o trabalho não funciona. Forçar uma situação nunca é bom.

Sincodiv-SP Online: Qual o perfil que mais procura o trabalho de coaching?

Marie-Josette: São diversas as pessoas que me procuram, mas poderia caracterizar quatro perfis principais: os seniores, as mulheres, os jovens e os teens.

Os três se referem a pessoas que passam por uma virada na vida. Os seniores me buscam quando são desprezados pelas empresas e não se adaptam ao mercado de trabalho. Muitas organizações falham quando menosprezam a experiência desses profissionais. Eles podem necessitar de uma atualização quanto às ferramentas, mas ninguém entende mais daquilo do que eles.

As mulheres procuram o coaching numa crise profissional, e o motivo é simples: elas não são homens. Homens e mulheres são diferentes e se complementam, e não se substituem. Como aqui no Brasil a entrada das mulheres no mercado de trabalho (especialmente em posições de liderança) ainda é recente, é normal que haja crises desse tipo, em que uma mulher é requisita a agir da mesma forma que um homem. O ideal é respeitar a diferença entre os gêneros e utilizar a sensibilidade e potencial de cada um para o desenvolvimento profissional.

Os jovens procuram um trabalho de orientação quando chegam no turning point (ponto de virada) da carreira, entre 28 e 35 anos. É difícil ver um jovem no início profissional (logo depois da faculdade, por exemplo) buscar o meu trabalho. A empolgação não deixa que parem para refletir.

Chamo de teens aquelas pessoas que buscam auxílio para descobrirem o que querem fazer na graduação. É uma fase muito difícil e de grande responsabilidade, especialmente porque todos colocam na cabeça dele que sua escolha influenciará sua vida toda. Imagine se, aos 18 anos (às vezes até menos), alguém tem capacidade de saber o caminho que quer seguir pelo resto da vida? A pressão é grande e podem ser criadas barreiras nesse período também.

Sincodiv-SP: Essas barreiras seriam as crenças limitantes de que fala? De onde vêm?

Marie-Josette: São verdades que compramos prontas e que nos impedem de alcançar o desenvolvimento desejado. É muito difícil precisar de onde vêm, as fontes são praticamente infinitas. Desde ditados populares até ensinamentos de família, tudo pode se transformar numa espécie de barreira.

Sempre escutamos coisas como “nada é fácil”, “a vida é isso… a vida é aquilo”. Esse tipo de ladainha é passada por pessoas que admiramos quando somos pequenos e, logo, instauramos tais palavras como verdades em nós. Sem contar as decisões limitantes.

Sincodiv-SP Online: Que seriam…

Marie-Josette: Coisas que falamos, decisões que tomamos em determinado momento da vida e que, sem nos darmos conta, se tornam barreiras porque nos perseguem como verdades absolutas. Uma vez assim, não somos sequer capazes de enxergar possibilidades. Assumidos uma posição conformista, determinada inconscientemente.

Sincodiv-SP Online: Então é difícil identificarmos nossas próprias crenças e decisões limitantes?

Marie-Josette: Sim, muito! Normalmente precisa de intervenção, algo externo que te mostre alternativas. Tanto por isso que viajar é altamente recomendável. Quando você viaja, especialmente para outros países e culturas, sai da área de conforto e vê que as coisas podem ser diferentes. Quando a crise é forte, porém, é necessária a ajuda de um profissional.

Sincodiv-SP Online: Para concluir, você conseguiu sair dessa área de conforto? Qual você diria que é a sua marca pessoal?

Tive de buscar minha Personal Branding sozinha, sair do comodismo, e é por isso que tenho paixão em ajudar as pessoas nesse sentido. Quando saí da psicoterapia voltada para os casos patológicos e fui me dedicar a outras áreas, montagem de palestras, cursos e workshops, tive de quebrar crenças e decisões limitantes. O fato de ser uma francesa/brasileira também me abriu os olhos para diferentes mundos.

Hoje, só posso fazer o que faço porque passei pelo processo e acredito no desenvolvimento das pessoas. Essa é minha marca.

Conteúdo produzido por Moraes Mahlmeister Comunicação. Entrevista realizada e redigida por Renan De Simone, editada por Juliana de Moraes. Publicado pelo site do Sincodiv-SP Online em outubro de 2011.

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