Sou uma mala aberta, velha, fácil de se enxergar e entender. Sou muralha de fogo ardente, que brilha forte, impressiona, atrai, mas ao mesmo tempo repele e é intransponível… e basta um pouco de água, de fluidez, para acabar comigo, ou para incandescer-me ainda mais.
Sou também dor e isso é impossível de não ser, de não ter, de não doer. Machuco aos outros e a mim mesmo, especialmente este último.
Parece que é parte de ser humano ter uma falha, um vácuo, um vazio pertinente e permanente. A falta que nos move também nos remove, nos tira de nós mesmos ao mesmo tempo em que nos coloca num lugar. “E que lugar é esse?” é o que sigo a me perguntar.
A realidade é muito pesada para mim às vezes, mas também não é nada, é leve e irrelevante. Ela, na verdade, não é o bastante, e machuca. Machuca viver nela quando dentro da minha mente e fantasias é tão melhor. O mundo demanda algo de mim a todo instante, e não sei o que ele quer, o que deseja. O problema é que também não sei o que eu quero… E quero tanto ao mesmo tempo.
Eu… um pronome tão pequeno para tentar definir um conceito tão amplo, tão complexo e tão insignificante. Não sou nada, sou pó, sou passado, sou um conceito que se desfaz a cada instante, que está obsoleto no momento em que surge, sou morte, uma pequena e dolorosa morte a cada momento! Com possibilidades de renascimento, talvez. Mas não hoje. Tem dias que só estou estático em uma angústia inexplicável. Passa, sei que passa. E volta, sei que uma hora ou outra retorna. Um ciclo, um círculo, e um caminho só de ida. Vai entender.
“O que se passa na minha cabeça e em meu coração?”, muita gente já me perguntou! Já me disseram que queriam ser um bichinho para entrar na minha mente e ver o que penso e sinto. Bem, minha dica é que para que, caso consigam essa metamorfose, não o façam. Posso garantir que minha cabeça é um terreno árido e fértil, gentil e perigoso, poético e grosseiro, caótico, cheio de tempestades belas e calmarias tristes: sou cheio de mim, afinal, e de cada pessoa que me compôs.
Eu estou treinado em ali viver desde sempre e ainda me perco, me machuco, caio nas farpas que eu mesmo crio e revivo.
Vivo o agora concomitantemente ao futuro que sempre vem e nunca chega, novo a cada segundo e velho no seguinte. Além de tudo, vivo o passado, todas as minhas memórias acontecendo ao mesmo tempo. Como diria o velho filme revivido, ‘esse é o meu dom e minha maldição’.
Talvez todas as minhas respostas sejam uma mentira bela que contei a mim mesmo e para o mundo ao meu redor, e não é o que todos fazem? Inventam respostas e as dizem como uma novidade! E o certo é que as perguntas importam mais que as respostas, e nem mesmo posso dizer que questionei as corretas, as que queria, que deveria.
Estou numa intersecção de realidade. Sempre estive e nem sempre notei. Consigo suportar a vida pelas minhas fugas do que é dito real, e só tenho algum valor pelas palavras que saem de mim, mas elas não são reais, são criações, invenções etéreas. Pedem-me cada vez para ser menos sonhador, e eu deveria mesmo, já que sou fraco demais para perseguir as coisas que movem meu peito, e sou teimoso demais para me declarar como um perdedor total, sabe-se lá o que isso quer dizer.
Entretanto, se eu deixar de ser sonhador, não vou conseguir fazer, por mais tolo que seja, as poucas coisas que exigem de mim. E se continuar a ser, desaponto e arrisco me perder sem volta.
É isso! Vivo numa bifurcação em que ambos os caminhos são errados. O certo é o entremeio, a entrelinha, a intersecção, a dúvida. Consigo ser eu mesmo, viver onde vivo, pensar o que penso, mesmo que não consiga explicar e a lógica me escape, mas dói ser assim.
Ser gente é algo que já incomoda, mas ser a gente mesmo incomoda mais. E ainda é a única forma de resistir…
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Parabéns ao meu escritor, poeta e jornalista preferido, cada dia sonhando mais alto, sucesso sempre