O que se defende

cotidianoNo do dia 18 de outubro publiquei um texto um tanto crítico (Morre um ideal – “Remember, remember…”) aqui no blog, mas caí na besteira de utilizar uma frase que não era bem o que eu queria, ou era… explico.

Meu amigo Paulo do blog Formas de (ex)pressão fez um texto que curti muito (se quiserem conhecer, recomendo – ta aqui) e que, um dia antes, eu tinha lido e comentado.

Dentre outras coisas que o texto trazia, foi citada essa questão da “crise de sentido” que tratei no texto do dia 18, mas tomei um caminho perigoso quando usei a frase dele em outro contexto, mesmo que tenha ressaltado o uso desta forma.

Paulo falava de um sentimento inominável, visceral, que era despertado, naquele contexto, pelas músicas do Nirvana, que fazia um sentido sem fazer, ou que esse era o próprio sentido, enfim, as leituras são muitas (e todas interessantes).

Ocorre que peguei uma frase desse texto, que me fez pensar nessa “crise de sentido”, e a utilizei de uma outra forma. Fato é que a expressão usada por ele me despertou algo e daí eu a signifiquei quase que pelo seu oposto em meu texto. Segue trecho do meu texto posterior ao uso da frase:

“O contexto do texto era outro, portanto, minha crítica não é à sensação que ele descreve dentro daquele sentido, mas acredito que essas palavras se encaixam bem nesse outro contexto. Estamos constantemente sentindo algo, forte, visceral, que não sabemos o que é, mas que, de alguma forma, o sentido nos escapa, e nos condicionamos ao escape deste uma vez que é mais fácil não nomear do que se propor a defender algo que talvez seja derrubado.”

Como o meu texto tratava da falta de “disponibilidade” que temos hoje em dia em defender ideias pelo simples fato de que elas caem, modificam-se, essa “não-nomeação” do sentimento foi traduzida quase que como uma inércia, um não enfrentamento. Algo do tipo “todos sentem, mas ninguém dá nome porque não há mais o que defender atualmente”.

Daí alguns comentários, conversas e textos (alguns do próprio autor do texto do Nirvana) me fizeram repensar as coisas e esclarecer algo.

O que defendo naquele texto – e vou tentar manter essa posição apesar de, como citei nele mesmo, minha mente ficar me lembrando de todos os opostos disso – é que nossos conceitos estão sendo pulverizados não por uma vontade ou decisão do indivíduo, sujeito, etc., mas sim por uma possível imposição. Levantei a bola de uma forma de dominação por meio do capital (que, convenhamos, não é nada nova). A ideia é: talvez possa ser diferente, menos díspar, menos canibal.

Entretanto, não dá pra negar que a busca de sentido, por mais que uma ideologia, conceito ou ideia predomine em determinado tempo, é muito particular, inconscientemente determinada e tem sentidos tão diversos quanto o número de pessoas que de determinada cultura fizerem parte.

Não quero que alguém crie um ideal único e nos lidere. Quero que as ideias possam voltar a ser fortes o suficientes para mover o sujeito (falo puramente de mim, não?) e que ele tenha o direito de acreditar nelas sem medo de ser pulverizado junto com possíveis mudanças.

Um comentário do próprio Paulo me deixou pensativo e concordo com ele, afinal. Ao “nomear” (ou apontar, no caso), tal sentimento visceral causado por músicas que tinham uma força enorme, derrubamos aquilo que trazia tal força… a sensação, o sentimento primevo que tais obras causam. Nomear é simbolizar, significar e, por si só, é o movimento que nos afasta do Real, da causa, e coloca algo no lugar daquilo que estava em nós se manifestando.

Qual é a ligação, afinal?

Simples. Quando defendo o direito do sujeito se apegar a valores, não convoco uma liderança, mas peço empatia (muito em falta atualmente e sentimento que, por si só, é impossível e imaginário, já que nunca podemos estar realmente no lugar de outro), mesmo com todas as suas contradições.

Peço o direito de acreditar num ideal, seja religioso, filosófico, artístico… Não luto pelo engessamento de conceitos, a mudança é o que causa o interesse da vida, todos podem mudar sua opinião. O que peço, afinal é o direito de acreditar, sentir, defender e lutar por aquilo que nos faz sermos nós mesmos e cada um individualmente.

Não me importa se é o cotidiano que te motiva (afinal, só existe a “vida comum”, de acordo com Freud), se é Deus, Sócrates (filósofo ou jogador), seus pais, ou sua banda… que continue, que acrescente! O que levanto aqui é o questionamento de não deixar o Mercado se estabelecer como único ditador de conceitos e regras, mesmo quando defende uma suposta liberdade de ação. Que ele seja um dos motivos, tudo bem, mas é inaceitável que seja o único, não para mim.

“Algumas coisas devem ser sentidas e só sentidas, sem a necessidade de se dar um nome para isso. Outras já deveriam assumir formas mais estabelecidas, assim podem ganhar não só em quantidade, mas também em força e ideais. O problema é que está tudo misturado…”*

*A frase final é do comentário do Paulo, do Formas de (ex)pressão, no meu texto do dia 18 de outubro.

A imagem é daqui

Publicado por

RDS

Jornalista, escritor, metido a poeta e comediante. Adorador de filmes e livros, quem sabe um filósofo desocupado. Romântico incorrigível. Um menino que começou a ter barba. Filho de italianos, mas brasileiro. Emotivo, sarcástico e crítico, mas só às vezes.

4 comentários em “O que se defende

  1. Uma saudade, um momento nostágico que nunca se viveu. Não pela maturIDADE, mas pelo tempo histórico, creio que a idéia de “valor forte”, de ideologia, ainda persiste, só que num outro tempo x espaço, no mercado e em todos os outros M relacionados, moda, marketing e etc… Parece-me que o valor ideal do momento é ter vários valores, várias identidades, facetas que caem e são reinventadas na “vida comum”.

    Sinto falta sim, de um sentimento que não pode/consegue ser nomeado, e não falo do Voldmort, falo de algo que faz o individuo “acordar, levantar e agir”, ter ação de verbo, não no sentido hollywoodiano, mas no sentido de um “ser” que se sujeita ao Sujeito do Inc. e tem noção disso. Um indivíduo subjulgado a “não escolher”, ou “viver escolhendo”.

  2. O mundo sente saudade de novos pensadores. Glorificamos os antigos por estarmos pobres de idéias revolucionarias. Ideias que vão além da cor do esmalte, do carte de cabelo ou da camisola da atriz da novela.

    Ideias que possam contribuir para a sociedade e transforme-a em um lugar mais pensante. Pensar requer sacrifício e hoje o cidadão está tão acostumado com o imediato que pensar em algo útil, fica sempre para depois…

  3. Creio que “o pensar algo útil” seja parte do problema, ou seja, pensar sempre com uma finalidade, pensar para resolver algo, sempre objetivo e não mais abstrato, artistico e subjetivo. Eu sei que parece balela eu falar isso, mas duvido que os “pensadores do passado” pararam e disseram: “- ok, estou no meu horarário de almoço, agora vou dar uma pausa para pensar e quem sabe criar algo utilizável pela sociedade humano até o fim dos tempos…rs.. ”

    É nisso que este texto me incomodou, pois nossa geração esta “cansada” de pensar, cansada de defender um ideal que sabe-se que até o fechamento da bovespa, pode ter caido por terra, valores efêmeros.

    Em consequência deste imediatismo, que o mercado nos “presenteia”, não há mais necessidade de pensar no que se quer ou precisa, o mercado te dá a “idéia do que querer” e ainda por cima, apresenta opções, das quais vc OPTA, compra e ainda agradece pelo seu cartão de crédito vencer apenas no mês que vem… rs

    É Tenso!

  4. Ei Renan, se por “besteira” vc tá entendendo coisas feitas por um besta, discordo! Mas se “besteira” está no sentido de coisa sem sentido… UAU!!! Não é esta a questão?! Que ótima besteira! Aliás, vamos mudar a letra da música: “Beste-i-raas! Eu quero umapra viveeerrr”.
    Se fulano disse A ciclano ouvirá RST… Se eu disse uma coisa e vc significou outra, faz parte do contrato. Fatos assim levaram Lacan a situar o professor como uma das profissões impossíveis. Ora, quando este tenta passar um conteúdo X, experimente questionar as pessoas sobre o que elas entenderam, cada um dirá uma coisa. Por conveniência (talvez alguns me amaldiçoem por isto) dizemos que é a mesma coisa. Trocar uma letra aqui outra ali não muda o sentido do todo… Se vc tiver que ser preso à força e, por acaso, não colocarem a cedilha, já deu pra entender para onde vc vai…
    O melhor é que estes incomodos, ao menos em suas mãos tornam-se produções. Ótimas produções, por sinal! Então que fique assim! rsrs
    Li esta frase e achei que se encaixa muito bem aqui: “Pensar é esquecer diferenças, é generalizar, abstrair.” (Jorge Luis Borge em Funes, o memorioso).
    Eu disse besteiras?! rsrs

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