É no mínimo curioso como algumas afirmações atuais não condizem com o rumo que nossa sociedade está tomando. Ontem, num dos assuntos abordados durante minha aula na pós, foi levantada uma questão interessante: por que é que se multiplicam os especialistas no mundo?
As duas respostas mais rápidas que surgiram foram: porque não se pode saber tudo; e porque o mercado precisa deles.
A primeira é quase um senso comum…
A segunda parece ser a mais óbvia. Já há alguns anos que a iniciativa privada é a responsável pelos principais investimentos pela busca de “novos” conhecimentos e, assim, se torna claro que, digamos, uma indústria de farmacológicos não tenha interesse direto em investir numa pessoa, ou numa equipe, que além de pesquisas químicas, também passa algum tempo estudando arqueologia ou física quântica, por exemplo.
Isso é um tanto quanto triste, talvez, para aqueles que gostam de diversos saberes, são curiosos e não se contentam em saber “só” de Literatura, Matemática, História, ou seja lá qual for sua área.
O mercado produz para o próprio mercado e, logo, não haveria interesse em produzir generalistas, uma vez que, quanto mais dentro de uma técnica específica e alienado do conjunto, melhor este ser tende a executar seu trabalho e seu processo de consumo e descarte rápido de produtos. “Ora, para que consertar, eu nem sei como isso funciona, melhor comprar outro”.
O que mais surpreende, no entanto, são as correntes diversas que falam de uma interdisciplinaridade, multidisciplinaridade… está difícil de encontrar tudo isso, e mesmo dentro da Academia, são poucas as vertentes que defendem diversos saberes.
Eu disse que a primeira afirmação parecia a mais senso comum e agora volto nesse ponto dizendo o quão perigoso é pensar assim: rotular e esquecer. Afinal de contas, parece que as duas afirmações têm tudo a ver.
Alguém diria que é porque se você não decide o que quer e, faz um pouco de tudo, não consegue construir uma carreira, consequentemente não foca (que palavra mais na moda) em nada.
Pois bem, quando algo está estabelecido bem demais (“não podemos saber tudo”), há que se desconfiar de onde vem essa afirmação.
Pesquisas biológicas, neurológicas e etc. afirmam que o cérebro tem uma capacidade de armazenamento, e processamento (para nos comparar a máquinas) enormes e que nossa vida caberia, sim, toda dentro dele e ainda sobraria espaço.
Se temos uma ferramenta tão poderosa assim a nosso favor (em nós), o que, então, nos impede de alimentá-lo quase que infinitamente com conhecimentos (reparem que digo conhecimento e não informação apenas) e de vagar por entre diversas ciências tentando conectar os saberes ao invés de ingerir uma sopa fragmentada?
Como disseram ontem (não a esse respeito, mas também sobre um caso de questões contraditórias), um dos dois está errado. Ou o cérebro não é tão poderoso ou você pode, sim, saber de tudo e não precisar ser um “mero” (e olha que curioso esse adjetivo junto com essa palavra aclamada atualmente) especialista.
As questões se juntam aí e sigo uma linha quase conspiratória que inclui esse post abaixo: quem, afinal se beneficiaria de especialistas, não só a curto prazo, por uma questão técnica, mas a longo, no sentido de barrar conexão de saberes? (não é legal quando queremos esconder algo de uma pessoa e, para isso, basta dar a ela muita informação sobre algo e impedir, simplesmente, que ela estabeleça conexões com outras informações e produza conhecimento?).
E aí, qual será seu caminho? Você será um especialista, uma conexão de saberes, ou vai engolir esse papo de que não podemos saber tudo, inclusive por uma questão real de limite de tempo?
A propósito… quem ou o quê toma mais tempo da sua vida mesmo?
O cérebro veio daqui
Esse nosso problema capitalista é mais antigo do que parece. O Paul Valéry já criticava a super especialização do trabalhador no começo do século 20, antes mesmo das guerras mundiais. Dele, lê os artigos ‘Introdução ao método de Leonardo da Vinci’ e ‘Monsieur Teste’.